domingo, 14 de março de 2021

BOA NOITE! DEUS SEJA LOUVADO!

 


14 de março de 2021


EVANGELHO DE TOMÉ: UM OUTRO JESUS: O QUE DIZ OS APÓCRIFOS?




Os evangelhos apócrifos – textos que foram proibidos pela Igreja e que desapareceram por mais de um milênio- trazem um Jesus diferente daquele que conhecemos

Quem não conheceu a si mesmo não conhece nada, mas quem se conheceu veio a conhecer simultaneamente a profundidade de todas as coisas.

Esta frase acima é atribuída a Jesus Cristo. Mas não adianta ir procurá-la na Bíblia. Ela não está em nenhum lugar dos Evangelhos de Lucas, Marcos, Mateus ou João, os únicos relatos da vida de Jesus que a Igreja considera autênticos. A citação faz parte de um outro evangelho – o de Tomé. Também não perca seu tempo procurando por esse livro no Novo Testamento. Não há por lá nenhum evangelho com o nome do mais cético dos apóstolos, aquele que queria “ver para crer”.

Acontece que o texto existe. E é um documento antigo – segundo alguns pesquisadores, tão antigo quanto os que estão na Bíblia. O Evangelho de Tomé, assim como outras dezenas – ou centenas – de textos semelhantes, foi escrito por alguns dos primeiros cristãos, entre os séculos I e III da nossa era. Ele foi cultuado por muito tempo. Até que, em 325, sob o comando do imperador romano Constantino, a Igreja se reuniu na cidade de Niceia, na atual Turquia, e definiu que, entre os inúmeros relatos sobre a vinda de Cristo que existiam, só quatro eram “inspirados” pelo filho de Deus – os “evangelhos canônicos” (“evangelho” vem da palavra grega que significa “boa nova”, usada para designar a notícia da chegada de Cristo, e “canônico” é aquele que entrou para o cânone, a lista dos textos escolhidos). Os outros eram “apócrifos” (de legitimidade duvidosa). Estes foram proibidos, seus seguidores passaram a ser considerados hereges e muitos foram excomungados, perseguidos, presos. A maioria dos apócrifos acabou destruída e os textos sumiram, alguns para sempre.

Mas nem todos. O Evangelho de Tomé, o de Filipe e o de Maria Madalena, por exemplo, escaparam por pouco da destruição – graças a um egípcio anônimo. Em algum momento do século 4, esse egípcio teve a boa ideia de esconder num jarro de barro cópias manuscritas na língua copta desses textos e de muitos outros ameaçados pela perseguição da Igreja. O jarro ficou 1 600 anos sob a areia do deserto. Acabou resgatado por um grupo de beduínos, em 1945, perto da cidade egípcia de Nag Hammadi. Só nos últimos anos os textos acabaram de ser traduzidos e chegaram ao conhecimento dos cristãos do mundo.



Assim, por acidente, alguns apócrifos sobreviveram ao tempo. E agora, 2 mil anos depois da morte de Cristo, eles estão fazendo um tremendo sucesso. Inspiram filmes milionários (como Matrix) e best sellers (como O Código Da Vinci). São adotados por seitas cristãs, geram religiões, dão origem a teorias conspiratórias e são cada vez mais lidos por fiéis do mundo, inclusive cristãos tradicionais, que não vêm contradição entre alguns desses textos e a religião que eles seguem. Só no Brasil há pelo menos 30 grupos cujas crenças são baseadas nos apócrifos. Como explicar essa súbita popularidade para textos que estiveram sumidos por mais de um milênio e meio?

Talvez a principal razão seja o fato de que os textos revelam mais sobre Jesus. Os quatro evangelhos canônicos contam uma história fascinante, mas deixam muitas brechas. Os cristãos do mundo têm vontade de saber mais sobre esse homem, ainda que seja através de textos que a Igreja não considera legítimos.

E vários dos apócrifos trazem passagens reveladoras para aqueles que tentam enxergar o homem por trás do Deus. “É um Jesus mais humano, em situações mais próximas da vida de homens e mulheres de hoje”, diz o jornalista espanhol Juan Arias, do El País, autor de livros sobre a história do cristianismo. Arias, que cobriu o Vaticano por 14 anos, está terminando um livro em que resume as pesquisas históricas a respeito de Maria. Um dos temas que ele examina é a falta de referência em alguns apócrifos à virgindade da mãe de Jesus. “Que mulher se identifica com outra que foi mãe sem perder a virgindade?”, pergunta.

Além disso, vários apócrifos trazem o retrato de um Jesus diferente do que conhecíamos. “As questões de gênero, as relações de poder e até mesmo a espiritualidade estão colocadas em termos mais ecumênicos e holísticos nos apócrifos”, diz o frei franciscano Jacir de Freitas Farias, professor do Instituto São Tomás de Aquino, em Belo Horizonte. Frei Jacir promove retiros em que evangelhos apócrifos, meditação e ioga se misturam para proporcionar conforto espiritual aos participantes.

Veja por exemplo aquela citação lá atrás, a que abre a reportagem. O que está escrito ali é que nada é mais importante que a sabedoria, e que o autoconhecimento é o caminho para a sabedoria. Essa ideia – que não é muito diferente daquilo que prega o budismo – está completamente ausente dos evangelhos de Mateus, Marcos, João e Lucas. Qualquer bom cristão sabe que o Novo Testamento oferece um caminho de só duas pistas para a salvação. Primeiro: é preciso ter fé (ela remove montanhas). Segundo: suas ações têm que ser boas (ame o próximo como a si mesmo). Em nenhum lugar há referência a outra rota para o Paraíso. Nem Lucas, nem Marcos, nem Mateus, nem João mencionam a salvação pelo autoconhecimento, ou pela sabedoria.

Se o cristianismo tradicional ignorava a importância do autoconhecimento, a ideia não é nova para nós, ocidentais do século 21. Sigmund Freud, no século 19, trouxe para a ciência a ideia de que há algo para ser descoberto dentro de nós mesmos – no caso, o subconsciente – e que esse algo pode nos trazer conforto e felicidade. Talvez esteja aí – na herança freudiana – uma das explicações para o sucesso dos apócrifos nos tempos atuais.



Há outras. O Evangelho de Tomé e outros apócrifos falam ao coração de um contingente que não pára de crescer nos tempos atuais: os ávidos por espiritualidade, mas desconfiados da religião (é bom lembrar que a maior parte dos católicos brasileiros se diz “não praticante”). “O reino está dentro de vós e também em vosso exterior. Quando conseguirdes conhecer a vós mesmos, sereis conhecidos e compreendereis que sois os filhos do Pai Vivo. Mas, se não vos conhecerdes, vivereis na pobreza e sereis a pobreza”, diz o texto de Tomé.

Muitos apócrifos pregam também códigos de conduta menos rígidos que os do cristianismo tradicional. Numa passagem do Evangelho de Maria Madalena, Cristo diz que “eu não deixei nenhuma ordem senão o que eu lhe ordenei, e eu não lhe dei nenhuma lei, como fez o legislador, para que não seja limitada por ela”. Esse trecho parece contrariar a própria autoridade da Igreja. Em Tomé, também aparece um Jesus menos dado a imposições, que diz “não façais aquilo que detestais, pois todas as coisas são desveladas aos olhos do Céu”. Bem diferente das aulas de catecismo, não?

Outra novidade é que vários apócrifos valorizam o papel da mulher. Os evangelhos de Filipe e de Maria Madalena afirmam que Madalena recebia revelações privilegiadas do Salvador. “O Senhor amava Maria mais do que todos os discípulos e a beijou na boca repetidas vezes”, afirma o de Filipe. Para Karen King, historiadora eclesiástica da Universidade Harvard, Madalena estava tão autorizada a pregar a palavra de Jesus quanto os 12 apóstolos. “Os textos mostram que Maria Madalena entendeu os ensinamentos de Jesus melhor do que ninguém”, afirmou, em entrevista à revista National Geographic.

Sem falar que muitos apócrifos deixam em segundo plano uma velha conhecida dos cristãos: a culpa. Você conhece a história dos livros canônicos: eu e você somos pecadores, e Cristo morreu na cruz para nos salvar. Nós pecamos, ele morreu – durma-se com isso na consciência. Já os evangelhos de Tomé, Filipe e Maria Madalena não contêm uma só linha sobre o julgamento e a condenação de Jesus. Ou seja, a Paixão de Cristo, que hoje consideramos central para a fé cristã, não tinha a menor importância para os seguidores desses textos. Nada de culpa, portanto. Ele traz apenas charadas que convocam seus leitores a reflexões espirituais.

Para resumir: os apócrifos revelam um Jesus mais democrático e menos sexista, mais tolerante e menos autoritário – características que combinam com nossos dias. Eles eliminam a culpa e abrem caminho para uma fé pessoal, algo que faz sucesso nestes tempos individualistas. Sem falar que estão cercados de uma charmosa aura de mistério. “Esta é uma sociedade que desconfia de qualquer instituição, então dizer que eles foram condenados pela Igreja vira um chamariz e tanto”, diz o teólogo Pedro Vasconcellos, da PUC de São Paulo. Deu para entender por que eles estão tão na moda?



Mas, afinal, que textos são esses? Dá para dizer que eles são vestígios de cristianismos perdidos. Sim, é isso mesmo: o cristianismo, no começo, não era um só, eram vários. “Nos séculos 2 e 3, havia cristãos que acreditavam em um Deus. Outros insistiam que Ele era dois. Alguns diziam que havia 30. Outros, 365”, escreve Bart Ehrman, professor de Estudos Religiosos a Universidade da Carolina do Norte, no livro Lost Christianities (“Cristianismos Perdidos”, sem versão em português).

Os primeiros cristãos viviam em comunidades clandestinas, que se reuniam às escondidas nas periferias das cidades e que tinham pouco contato umas com as outras. Essas comunidades eram lideradas muitas vezes por pessoas que conheceram Cristo ou pelos próprios apóstolos. Como Cristo não deixou nada escrito, coube a essas primeiras lideranças do cristianismo construir a religião.

Não há como saber se o Evangelho de Mateus foi escrito pelo próprio Mateus. “Naquele tempo, como ainda hoje, não faltava quem se candidatasse a pregar em nome de um personagem tão importante”, afirma o teólogo Paulo Nogueira, da Universidade Metodista de São Paulo. Mas é bastante provável que o texto tenha sido construído a partir dos ensinamentos do apóstolo recolhidos por seus seguidores. Da mesma forma, os evangelhos de João, Pedro, Maria Madalena, Tomé e Filipe devem ter sido os textos que guiavam as práticas dos grupos que se reuniram em torno dessas figuras importantes da religião nascente (ou que buscaram inspiração nelas). “Os evangelhos apócrifos, da mesma forma que os canônicos, não devem ser encarados como reproduções exatas das palavras de Jesus Cristo, mas como interpretações da mensagem dele feitas pelas primeiras comunidades cristãs”, diz o teólogo Vasconcellos. É claro que essas interpretações nem sempre concordavam umas com as outras. E, portanto, é claro que, naquela aurora do cristianismo, produziram-se diversos textos – muitas vezes contraditórios entre si.



Entre os primeiros grupos cristãos havia, por exemplo, os ebionitas, uma das seitas mais antigas. Eles se consideravam judeus e achavam que Jesus era o Salvador apenas do povo hebreu. Os ebionitas mantinham os rituais judaicos, rezavam voltados para Jerusalém e acreditavam que Cristo tinha sido especial não por ser filho de Deus, mas por ter seguido à perfeição a lei judaica.

No outro extremo, estavam os marcionitas, para quem havia dois deuses. O primeiro deles seria um deus mau – o deus dos judeus, responsável por tudo de ruim no planeta. Jesus seria o segundo, um deus bom, que teria surgido para nos liberar da divindade maligna. Esse cristianismo, que hoje soa bizarro, foi popular no começo do século 2, antes de ser condenado como heresia em 139. Uma das razões para o sucesso é que a tese de dois deuses exclui a culpa cristã. Se um deus mau criou o mundo, é ele o responsável pelos sofrimentos sobre a terra.

Os gnósticos tinham crenças aparentadas às dos marcionistas. Também para eles o mundo foi criado por uma divindade imperfeita e não havia por que nos sentirmos culpados pelos males que existem. A diferença é que os gnósticos acreditavam que o Deus bom influiu na criação. Ele dotou cada um dos seres humanos de uma centelha divina – que nos dava a capacidade de despertar dessa imperfeição e conhecer a verdade. Se conseguirmos acumular conhecimento (gnosis, em grego), nos libertaremos desse mundo mau e estaremos salvos. Cristo, para os gnósticos, seria um enviado desse Deus verdadeiro, cujo objetivo seria nos ensinar a despertar. A escrita e a leitura cumpririam um papel importante nesse processo, e por isso eles deixaram muitos textos (boa parte dos apócrifos são gnósticos). Nota-se uma forte influência da filosofia grega nesse cristianismo.

Há uma boa pitada de gnosticismo naquela frase do Evangelho de Tomé que abre esta reportagem. Mas os tomasinos (seguidores de Tomé) eram uma seita à parte. Eles também acreditavam na salvação pelo conhecimento, mas iam além: pregavam que a busca é completamente individual. Os tomasinos rejeitavam a hierarquia – e, portanto, a Igreja. A salvação está dentro de cada um de nós e podemos atingi-la sem a ajuda de um padre.

E havia, claro, os seguidores de Paulo e os de Pedro, fortes especialmente em Roma, bem no centro do império. Esse grupo, no início, não era maior nem mais representativo que os outros. A proximidade com a burocracia estatal que administrava o Império Romano certamente exerceu influência sobre ele – não é à toa que o cristianismo romano era o mais organizado e hierarquizado de todos.



Cada uma dessas comunidades cristãs seguia um certo conjunto de textos – e rejeitava outros. Mas a maioria considerava legítimos os evangelhos de Marcos, Matias, Lucas e João, que provavelmente são os mais antigos e menos controversos. Em 312, o imperador romano Constantino se converteu ao cristianismo. E foi o cristianismo de Roma que ele escolheu. Constantino administrava um império que era quase “universal”, e queria também uma “Igreja universal”. Quando, 13 anos depois, sob as ordens do imperador, a Igreja se reuniu para decidir o que era o cristianismo, os bispos de Roma, mais organizados e com o apoio decisivo do imperador, sobressaíram nas discussões. “O credo de Niceia acabaria por se tornar a doutrina oficial que todos os cristãos deveriam aceitar para participar da Santa Igreja, a Igreja Católica”, escreve o teóloga Elaine Pagels, da Universidade Princeton, nos Estados Unidos, no livro Além de Toda Crença: O Evangelho Desconhecido de Tomé.

Os textos que não davam importância à crucificação de Cristo acabaram proibidos. Afinal, a Igreja romana, que cresceu em meio a violentas perseguições, valorizava muito o martírio – associado ao martírio de Cristo. Os evangelhos dos tomesinos, que pregavam a busca individual pela salvação, também caíram fora. A hierarquizada Igreja de Roma obviamente não simpatizava com essas idéias libertárias. Entre os textos que foram proibidos, vários faziam parte das bibliotecas gnósticas. Para Eusébio de Cesária, que no século 4 escreveu o primeiro livro sobre a história do cristianismo, o gnosticismo estava sendo introduzido pelo demônio, “que odeia o que é Deus, que é inimigo da verdade, hostil à salvação do mundo, voltando todas suas forças contra a Igreja”. Acredita-se que os manuscritos de Nag Hammadi sejam tesouros salvos da biblioteca gnóstica do Mosteiro de São Pacômio, que ficava lá perto.

Ninguém sabe ao certo quantos evangelhos foram suprimidos. O que se sabe é que só quatro livros foram considerados “corretos”. Apenas neles “o ensinamento das linhas de Deus é proclamado. Não acrescentem nada a eles, não deixem nada se afastar deles”, segundo um decreto de um bispo de Alexandria. Daí para a frente, haveria quatro evangelhos. E, pela primeira vez, um só cristianismo.

Voltemos então à pregação gnóstica, expressa em vários dos evangelhos apócrifos. O mundo é mau por natureza, mas cada um de nós traz dentro de si uma centelha e, se atingirmos o conhecimento, iremos despertar. Jesus veio à Terra para nos ensinar o caminho. Agora substitua nessa história o nome de Jesus pelo de Neo. E temos um dos maiores sucessos pop dos últimos anos, a trilogia Matrix.

Matrix fez tanto sucesso porque toca num tema com o qual é difícil não se identificar: a sensação de não pertencer a esse mundo, de se sentir estranho nele, e de que ele é banal demais para nossas altas aspirações espirituais. É claro que seria um absurdo dizer que o sujeito que saiu do cinema empolgado com a saga dos irmãos Wachowski tenha sido tocado pelo mesmo tipo de revelação que os cristãos envolvidos pelas pregações gnósticas no século 2 ou 3. Mas talvez não seja por coincidência que o roteiro, inspirado por textos gnósticos, tenha soado tão transcendental .

Os evangelhos , assim como os canônicos, foram escritos por pessoas inquietas, numa época conturbada e difícil, em que as antigas respostas já não davam conta de acalmar os espíritos. É claro que os tempos, hoje, são muito diferentes. Mas, de novo, boa parte da humanidade está inquieta e insatisfeita com as respostas que existem. Tem muita gente em busca de alguma coisa que torne nossa existência mais transcendente, mais valiosa. E esses textos escritos por outros homens, numa busca parecida, podem nos dar uma dica de onde começar a procurar.


por Érica Montenegro
Dezembro de 2004

BIBLIOGRAFIA
Lost Christianities: The Battles for Scripture and the Faiths We Never Knew – Bart D. Ehrman, Oxford University Press, EUA, 2003
Além de Toda Crença: O Evangelho Desconhecido de Tomé – Elaine Pagels, Objetiva, Rio de Janeiro, 2003
Apócrifos da Bíblia e Pseudo-Epígrafos – Cristão Novo Século, São Paulo, 2004
As Origens Apócrifas do Cristianismo – Jacir de Freitas Faria, Paulinas, São Paulo, 2003
Jesus, Esse Grande Desconhecido – Juan Arias, Objetiva, Rio de Janeiro, 2002

COMO NASCEU O SÍMBOLO CRISTÁO DA CRUZ?

© Dainis Matisons
Javier Ordovás - publicado em 20/08/14

Conheça o significado que a cruz tinha antes da vinda de Jesus e como ela foi adquirindo a conotação cristã que conhecemos hoje

“Quem quiser ser meu discípulo, tome sua cruz de cada dia e me siga” (Mt 16,24; Lc 9,23; Mc 8,34; 10,21). A cruz é o melhor símbolo do estilo de vida que Cristo nos ensinou.

São Paulo resumia o Evangelho como a pregação da cruz (1 Cor 1, 17-18). Por isso, o Santo Padre e os grandes missionários pregam o Evangelho com o crucifixo na mão: “Os judeus pedem milagres, os gregos reclamam a sabedoria; mas nós pregamos Cristo crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os pagãos; mas, para os eleitos – quer judeus, quer gregos –, força de Deus e sabedoria de Deus” (1 Cor 1, 22-24).

Uso pré-cristão da cruz como símbolo

Em quase todos os lugares do mundo antigo, foram encontramos vários objetos, que datam de períodos muito anteriores à era cristã, marcados com cruzes de diferentes estilos.

O uso da cruz como símbolo religioso em tempos anteriores ao cristianismo e entre povos não cristãos pode ser considerado quase universal e, em inúmeros casos, estava relacionado a alguma forma de adoração da natureza.

É um fato inquestionável que, em épocas muito anteriores ao nascimento de Cristo, e desde então em terras não tocadas pelos ensinamentos da Igreja, a cruz foi usada como símbolo sagrado.

Uma das representações mais antigas é a suástica ou cruz gamada, que, em diversas religiões, em especial no hinduísmo, simboliza o fogo ou o sol (por sua rotação diária), bem como o relâmpago.

Outro símbolo relacionado à cruz é o anjkh egípcio, símbolo da vida, que posteriormente foi adotado pelos cristãos coptas no Egito, talvez fundindo seus significados.

Na Idade do Bronze, surgiu na Europa, em diversos objetos, uma cruz parecida à latina, talvez com fins não somente ornamentais, mas também religiosos, dado que era frequente nos cemitérios e lugares sagrados.

Tempos modernos


Na cristandade, a cruz representa a vitória de Cristo sobre a morte e sobre o pecado, já que, segundo suas crenças, graças à cruz Ele venceu a morte em si mesma e resgatou a humanidade da condenação.

Os católicos, ortodoxos e coptas fazem o sinal da cruz, movimentando sua mão direita e desenhando uma cruz sobre eles mesmos, para iniciar suas orações e ritos cotidianos. O sinal da cruz já era uma prática comum dos cristãos na época de Santo Agostinho (século V).

Os bispos católicos, ortodoxos e anglicanos assinam seus documentos antepondo uma cruz (+) aos seus nomes.

A cruz é o símbolo radical, primordial para os cristãos: um dos poucos símbolos universais, comuns a todas as confissões.

Durante os três primeiros séculos, parece que não se representou plasticamente a cruz: preferiam as figuras do pastor, do peixe, da âncora e da pomba.

Foi no século IV quando a cruz se tornou, pouco a pouco, o símbolo predileto para representar Cristo e seu mistério de salvação.

Desde o sonho do imperador Constantino, em 312 (“In hoc signo vinces”, “com este sinal vencerás”), que precedeu sua vitória na Ponte Mílvia, e a descoberta da verdadeira cruz de Cristo, em Jerusalém, no ano 326, pela mãe do mesmo imperador (Helena), a atenção dos cristãos com relação à cruz foi crescendo.

A festa da Exaltação da Santa Cruz, que celebramos no dia 14 de setembro, já era conhecida no Oriente desde o século V, e em Roma pelo menos desde o século VII.

As primeiras representações pictóricas ou esculturais da cruz mostram um Cristo glorioso, com uma longa túnica e uma coroa real: está na cruz, mas é o vencedor, o Ressuscitado.

Só mais tarde, com a espiritualidade da Idade Média, Cristo começou a ser representado em seu estado de sofrimento e dor.

Atualmente, a cruz é um símbolo muito repetido em suas variadas formas:

– A cruz que preside a celebração, sobre o altar ou perto dele.

– A cruz da procissão que encabeça o rito de entrada nas ocasiões mais solenes.

– As cruzes que colocamos em nossas casas.


– A cruz peitoral dos bispos e o báculo pastoral do papa. Basta recordar o magnífico báculo de João Paulo II, em forma de cruz, herdado de Paulo VI.

– As cruzes penitenciais que os “nazarenos” usam sobre as costas nas procissões da Semana Santa.

– A cruz como enfeite e até como joia, que muitas pessoas usam como pingente.

– As variadas formas de “sinal da cruz” que traçamos sobre as pessoas e as coisas (em forma de bênção) ou sobre nós mesmos, em momentos tão significativos, como o início da Missa ou o rito do Batismo.


CRUZJESUSORAÇÃO

14 de março de 2021